HISTÓRIA REGIONAL
COLUNISTA - Adirson vasconcelos
SAYÃO, O BANDEIRANTE MODERNO
Por Adirson Vasconcelos
Membro da ACLEB-Academia de Letras de Brasília e do IHG-DF
Bernardo Sayão (⭐︎ 18/06/1901, Rio de Janeiro-✞ 15/01/1959, Açailândia) |
Um galho gigantesco da floresta amazônica despenca de uns quarenta metros de altura e cai sobre o construtor da Belém-Brasília, o engenheiro Bernardo Sayão, quando faltavam apenas duas semanas para a conclusão dos trabalhos pioneiros de desmatamento da estrada.
Esta notícia correu o Brasil de ponta a ponta, no dia 15 de janeiro de 1959, quando a construção de Brasília e da estrada Belém-Brasília eram temas do cotidiano e o nome de Sayão significava audácia, pela sua tarefa de desbravar a floresta amazônica, tida como "intransponível", e plantar, nela, uma estrada que ligaria o Brasil de Norte a Sul, tendo Brasília como ponto de interligação.
JK E BERNARDO SAYÃO
O presidente Juscelino Kubitschek, com quem Bernardo Sayão muito se afinava — naturalmente pelo espírito bandeirantista que os identificava —assim o homenageou na despedida:
"Aqui vim dizer adeus a Bernardo Sayão, morto no campo de honra — morto na batalha em favor do novo Brasil. Mas, a glória começa exatamente na hora em que ele deixa este mundo... Só nos consola de sua perda essa glória que começa a iluminar, agora, o vulto que acaba de consumar o seu sacrifício até a mais trágica consequência. Pode-se dizer que Bernardo Sayão fez a oferenda de sua própria vida ao seu ideal."
Bernardo Sayão, que era um entusiasta do sonho de ver o Brasil interligado de Norte a Sul, via rodoviária, disse, certa feita, ao presidente Juscelino: "No dia em que a estrada Belém-Brasília estiver concluída, posso partir para sempre. Terei dado o meu melhor esforço pela nossa causa."
Por isso é que o presidente Kubitschek, também na despedida a Sayão, anunciou à grande multidão que foi ao Campo da Esperança em Brasília:
"Dentro de quinze dias, os tratores que marcham conduzidos pelas turmas de soldados do progresso que partiram de Belém e de Brasília se encontrarão para consagrar o fim da epopeia. O grande, o generoso, o bom comandante estará então presente como nunca, embora invisível. Nós também não faltaremos. A estrada terá o seu nome."
Um candango anônimo das obras de Brasília, de olhos úmidos, pediu a palavra para colocar duas flores silvestres e sugerir que Sayão fosse enterrado de pé, "de pé como sempre soube viver, de pé como recebia o Presidente da República e a mais humilde criatura que o procurasse."
QUEM ERA SAYÃO
Bernardo Sayão era carioca da Tijuca e nasceu a 18 de junho de 1901. Formou-se em agronomia. Praticava futebol e remo. Casou-se com dona Lygia Mendes Pimentel, com quem teve Laís e Léa. Perdendo, em 1936, sua primeira esposa, contraiu núpcias, cinco anos depois, com dona Hilda Fontenele Cabral — hoje, dona Hilda Sayão de Araújo, que lhe deu os filhos Bernardo e Fernando e a filha Lia. Nomeado por Getúlio Vargas, dirigiu, em Goiás, a Colônia Agrícola Nacional, implantando-a à beira do Rio das Almas, onde nasceu a cidade de Ceres. À época, os jornalistas e escritores Hernane Tavares de Sá, Antônio Calado e John dos Passos (americano) destacaram os feitos de Sayão na Colônia de Goiás, dando-lhe projeção internacional. Goiás o convocou para ser Vice-Governador e o presidente Juscelino o quis diretor das obras de Brasília. Antes, como vice-governador, já dera os primeiros passos nas obras da futura Capital, construindo estradas, implantando um aeroporto que o chamou de Vera Cruz e levantou um cruzeiro no ponto mais alto da futura cidade. Desejando o Presidente interligar o Brasil de Norte a Sul, via rodoviária, convocou Sayão, que também comungava da ideia, para executar a difícil tarefa de abrir, meio à floresta amazônica, uma estrada pioneira ligando Brasília a Belém do Pará. Sayão topou, pois isto era um grande sonho seu. Quando foi vitimado pela floresta, faltavam apenas uns quinze dias para que as duas turmas — a que vinha de Belém e a que partira de Brasília — se encontrassem no ponto geográfico denominado Ligação, próximo a Açailândia e onde Sayão foi morto.
O presidente Juscelino o chamava de bandeirante moderno. Aliás, seu espírito, e até o seu físico, era de um bandeirante. Suas missões nunca tiveram o objetivo de exaurir, promovia sempre o progresso, despertando a produção e as riquezas potenciais do local. Assim foi em Ceres, em Brasília e na Belém-Brasília.
De porte atlético e espírito alegre, Bernardo Sayão era um homem cheio de fé, vigoroso, que distribuía vida, ânimo e otimismo. Impetuoso, másculo e bonito. Gostava de tocar lavoura, de criar gado, de andar a cavalo, de dirigir caminhão, jipe ou avião. Era um líder, um amigo, um homem de coração bom, mas, quando preciso, fazia as vezes de pai severo, de delegado ou de juiz. Sayão era um homem prático, objetivo e decidido. Fazia camaradagem facilmente, inclusive com os operários, dos quais era um verdadeiro ídolo. Haja vista que, quando correu a notícia de sua morte, o seu motorista, Benedito Segundo, caiu morto com um enfarte cardíaco.
UM SÍMBOLO NACIONAL
Bernardo Sayão teve a morte que queria —trabalhando e realizando algo de notável, um sonho que perseguia e que o presidente Juscelino lhe deu oportunidade de realizar, — uma estrada transbrasiliana. Caiu no ponto de encontro de dois Brasis, o do Sul e o do Norte, um ponto da Belém-Brasília chamado Ligação, a trinta quilômetros da cidade maranhense de Imperatriz. Um novo Fernão Dias que viu a morte quando o horizonte já estava quase ao seu alcance. Um Anhanguera. Um exemplo aos crentes e aos derrotistas, pois acreditava demais no Brasil. Sayão é um herói dos tempos modernos, um herói da batalha do desenvolvimento nacional — na feliz expressão do presidente JK. Um desbravador de sertões, um plantador de estradas, um fundador de cidades, um criador de novos horizontes, um pioneiro de Brasília e do Brasil.
Sayão é um símbolo nacional, cuja vida de serviços e dedicação ao seu País será lembrada, no futuro, nas escolas, como exemplo do passado às gerações vindouras. Que a geração de hoje, principalmente as autoridades constituídas, façam algo de reconhecimento a este herói da batalha do desenvolvimento e da integração nacionais —Bernardo Sayão Carvalho de Araújo.
Fonte: VASCONCELOS, Adirson: A EPOPEIA DA CONSTRUÇÃO DE BRASÍLIA, Brasília: Centro Gráfico do Senado, 1989, pp. 181-5.
♧ ♧ ♧
Vasconcelos relembra ainda na efeméride referente à data de 16 de janeiro de 2017 as seguintes informações complementares:
"Um dia diferente de todos os outros dias de Brasília, nos tempos da epopeia da construção da cidade-Capital. Em pleno 1959, quando é frenético o ritmo de trabalho e a vibração de todos, os milhares de pioneiros candangos ficam inertes e em emoção. Todos aguardam a chegada do corpo do engenheiro Bernardo Sayão, morto nas obras da Belém -Brasília, no dia anterior.
Bernardo Sayão acidenta-se na floresta que desbravava para construir a Belém-Brasília. Faltavam duas semanas para a conclusão da estrada. A notícia da morte de Sayão é fulminante para seu motorista, que tem um colapso cardíaco, e para seu cozinheiro, que fica "perturbado da cabeça". O Presidente JK sente o peso da perda.
Num avião da FAB, procedente de Belém do Pará, chega o corpo do bandieirante moderno. Do Aeroporto para a Igrejinha de Fátima, onde é velado. Consternação dos milhares de candangos, engenheiros e tantos outros pioneiros da epopeia de Brasília.
O sepultamento ocorre no dia 17, pela manhã. Cuida o pessoal da Novacap de abrir uma via de acesso à área destinada a ser o Cemitério da futura Capital, que se denominará Campo da Esperança, no final da Asa Sul. Joffre Parada comanda a obra.
Um ano depois da perda de Bernardo Sayão, os pioneiros do Brasil Novo ultimam, em 1960, os preparativos para a grande viagem pela estrada Belém-Brasília rumo a Brasília."